Dona
Ana de Sousa ou Ngola Ana Nzinga Mbande ou Rainha Ginga (c. 1583 — Matamba, 17
de dezembro de 1663) foi uma rainha (“Ngola“) dos reinos do Ndongo e de
Matamba, no Sudoeste de África, no século XVII. O seu título real na língua
quimbundo – “Ngola” -, foi o nome utilizado pelos portugueses para denominar
aquela região (Angola).
Nzinga
viveu durante um período em que o tráfico de escravos africanos e a
consolidação do poder dos portugueses na região estavam a crescer rapidamente.
Era filha de Nzinga a Mbande Ngola Kiluanje e de Guenguela Cakombe, e irmã do
NgolaNgoli Bbondi (o régulo de Matamba), que tendo se revoltado contra o
domínio português em 1618, foi derrotado pelas forças sob o comando de Luís
Mendes de Vasconcelos. O seu nome surge nos registros históricos três anos mais
tarde, como uma enviada de seu irmão, numa conferência de paz com o governador
português de Luanda. Após de anos de incursões portuguesas para capturar
escravos, e entre batalhas intermitentes, Nzinga negociou um tratado de termos
iguais, converteu-se ao cristianismo para fortalecer o tratado e adaptou o nome
português de Dona Ana de Sousa. No ano subseqüente, entretanto, reiniciaram-se
as hostilidades. As fontes divergem quanto ao motivo:
•Ngoli
Bbondi teria se revoltado novamente, fazendo grandes ofensas aos portugueses e
derrotando as tropas do governador português João Correia de Sousa em 1621.
Dona Ana, entretanto, teria permanecido fiel aos portugueses, a quem teria
auxiliado por vingança ao assassinato, pelo irmão, de um filho seu. Tendo
envenenado o irmão, sucedeu-lhe no poder.
•tendo
os termos do tratado sido rompidos por Portugal, Dona Ana pediu a seu irmão
para interceder e lutar contra a invasão portuguesa. Diante da recusa de seu
irmão, Nzinga, pessoalmente, formou uma aliança com o povo Jaga, desposando o
seu chefe, e subseqüentemente conquistando o reino de Matamba. Ganhou
notoriedade durante a guerra por liderar pessoalmente as suas tropas e por ter
proibido as suas tropas de a tratarem como “Rainha”, preferindo que se
dirigissem a ela como “Rei”. Em 1635 encontrava-se disponível para formar uma
coligação com os reinos do Congo, Kassanje, Dembos e Kissama. Como soberana,
rompeu os compromissos com Portugal, abandonando a religião católica e
praticando uma série de violências não só contra os portugueses, mas também
contra as populações tributárias de Portugal na região. O governador de Angola,
Fernão de Sousa, moveu-lhe guerra exemplar, derrotando-a em batalha em que lhe
matou muita gente e aprisionando-lhe duas irmãs, Cambe e Funge. Estas foram
trazidas para Luanda e batizadas, respectivamente com os nomes de Bárbara e
Engrácia, tendo retornado, em 1623, para Matamba.
A
rainha manteve-se em paz por quase duas décadas até que, diante do plano de
conquista de Angola por forças da Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais,
percebeu uma nova oportunidade de resistir. Traída eventualmente pelos Jaga,
formou uma aliança com os holandeses que à época ocupavam boa parte da Região
Nordeste do Brasil. Com o auxílio das forças de Nzinga, os holandeses
conseguiram ocupar Luanda, de 1641 a 1648.
Em
Janeiro de 1647, Gaspar Borges de Madureira derrotou as forças de Nzinga,
aprisionando sua irmã, D. Bárbara. Com a reconquista definitiva de Angola pelas
forças portuguesas de Salvador Correia de Sá e Benevides, retirou-se para
Matamba, onde continuou a resistir.
Em
1657, um grupo de missionários capuchinhos italianos convenceu-na a retornar à
fé católica, e então, o governador de Angola, Luís Martins de Sousa Chichorro,
restitui-lhe a irmã, que ainda era mantida cativa.
Em
1659, Dona Ana assinou um novo tratado de paz com Portugal. Ajudou a reinserir
antigos escravos e formou uma economia que ao contrário de outras no
continente, não dependia do tráfico de escravos. Dona Ana faleceu de forma
pacífica aos oitenta anos de idade, como uma figura admirada e respeitada por
Portugal.
Após
a sua morte, 7000 mil soldados da Rainha Ginga, foram levados para o Brasil e
vendidos como escravos. Os portugueses passaram a controlar a área em 1671. Em
certas áreas, Portugal não obteve controle total até o século XX,
principalmente devido ao seu tipo de colonização, centrado no litoral. No
Brasil, o nome da Rainha Ginga é referido em vários folguedos da Festa de Reis
dos negros do Rosário, onde reis do congo católicos lutam contra reis que não
aceitam o cristianismo.
Dona
Ana de Sousa possuía muitas variações do seu nome que, em alguns casos, eram
completamente distintos. Entre eles (mas não apenas, registram: Rainha Nzinga,
Nzinga I, Rainha Nzinga Mdongo, Nzinga Mbandi, Nzinga Mbande, Jinga,
Singa,Zhinga, Ginga, Ana Nzinga, Ngola Nzinga, Nzinga de Matamba, Rainha
Nzingha de Ndongo, Ann Nzingha, Nxingha, Mbande Ana Nzingha e Ann Nzingha.
Publicado
por Eileen Morais Salvação Barreto
Livro
conta história da rainha Ginga, heroína angolana
por
PEDRO ROSA MENDES, Paris 26 Julho 2010
Obra conta como Ginga reinou 40 anos e
resistiu durante 30 aos portugueses.
A
rainha Ginga (1582-1663) é apresentada como “uma protonacionalista angolana, na
luta contra o poder colonial português, e uma heroína de todo o continente”
numa nova obra… de referência publicada em França sobre “a mulher mais famosa
de África”.
Ana
de Sousa N’Jinga M’Bandi, a célebre rainha Ginga, “é uma das figuras mais
fascinantes da história africana”, resumiu o historiador e editor francês
Michel Chandeigne, entrevistado pela Lusa em Paris.
Michel
Chandeigne, fundador da Livraria Portuguesa em Paris e especialista da história
da expansão portuguesa, acaba de publicar N’Jinga, Rainha de Angola, numa
edição de referência do relato do padre Antonio Cavazzi de Monteccuccolo
(1621-1678).
O
volume, de 416 páginas, é a história da conversão de “uma rainha terrível” ao
catolicismo, considerada durante muito tempo como a força anticristã mais
terrível da África Central, explicou Michel Chandeigne à Lusa. Ginga reinou
durante 40 anos e resistiu quase 30 aos portugueses, com as suas tropas de
Jagas, “uma seita cruel”.
O
relato de Cavazzi, um missionário que desprezava os africanos mas que
paradoxalmente estudou em detalhe os seus cultos, é também o resultado do
fascínio que a heroína angolana exercia sobre os seus contemporâneos. O
fascínio foi partilhado pelo missionário que devia salvá-la para o Deus cristão
e que foi seu confessor. Cavazzi oficiou ele mesmo as exéquias da “Rainha dos
Jagas”. “Ginga era uma mulher inteligente. Todos, mesmo os seus inimigos da
época, têm um discurso unânime sobre isso. Tinha uma liberdade sexual total.
Dormia com escravos que estavam à sua disposição sob ameaça de morte se
tivessem encontros com qualquer outra mulher”, recorda Chandeigne. “Ginga tende
a ficar na história africana como a grande heroína do continente. Morreu muito
velha. Era uma mulher com uma força de homem, digamos, que comandou as suas
tropas no campo de batalha durante muitos anos. É uma figura proto nacionalista
de resistência aos portugueses e à opressão”, acrescenta também o historiador
francês. “Ao contrário do que se passou no Congo, onde a Igreja local estava
nas mãos da elite do país e onde a população abraçou por sua vontade o
cristianismo, em Angola a adesão à nova fé foi reticente e forçada”, escrevem
no prefácio ao livro Linda Heywood e John K. Thornton, dois dos maiores
especialistas do período abrangido pela vida de Ginga. O testemunho de Cavazzi
“é excepcional porque o homem era muito atento às práticas culturais, aos
cultos dos africanos, aos vestidos, à vida quotidiana. É um testemunho ímpar na
história das missões e temos também desenhos com descrição de sacrifícios,
práticas de justiça, penas de morte”, iconografia que corresponde aos relatos
de grande crueldade que atravessam a obra. A edição da Chandeigne sobre a
rainha Ginga, resultado de dez anos de trabalho, corresponde à primeira versão
da Histórica descrizione de tre regni Congo, Matamba ed Angola, manuscrito
descoberto em Modena (Itália) nos arquivos da família Araldi, em 1969. É deste
manuscrito “perdido” que Chandeigne reproduz as aquarelas com cenas da vida na
Matamba seiscentista.“Era uma mulher de poder, uma mulher livre, uma grande
heroína africana”, resume Michel Chandeigne. “Espero que com este livro o fenômeno
ultrapasse as fronteiras do mundo lusófono.”
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