quarta-feira, 16 de outubro de 2013

As comunidades remanescentes de quilombos configuram núcleos de resistência com diferentes históricos de formação.

COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOS BRASIL QUILOMBOLA

As comunidades remanescentes de quilombos configuram núcleos de resistência com diferentes históricos de formação, abrigando, em sua origem, a população negra escravizada e desprovida de acesso a políticas públicas, impossibilitada de manifestar sua cidadania e vivendo, muitas vezes, na absoluta miséria. Internamente, os quilombolas estão agregados a partir de uma necessidade de sobrevivência e de uma ancestralidade étnica comum, representada em seus elementos linguísticos, religiosos, culturais e na sua organização político-social. A terra que ocupam possui um forte significado simbólico, na medida em que se tornou o espaço geográfico necessário para a continuidade e a reprodução do modo de vida quilombola, marcado por modelos produtivos agrícolas e por seu uso coletivo. Conseqüentemente, o território de uma comunidade está intimamente relacionado à sua identidade: é o espaço em que se dão as manifestações culturais do grupo, onde se encontram valiosos resquícios arqueológicos e onde acontece a transmissão  inter geracional de seu patrimônio material e imaterial. Por outro lado, há várias ameaças que tensionam suas comunidades: a ocupação de suas terras por fazendeiros, empresas ou pelo próprio poder público; a legislação ambiental vigente que não reconhece os direitos das populações tradicionais e, muitas vezes, favorece conflitos nas regiões; o sistema educacional deficitário, em que as escolas não têm a manutenção garantida nem valorizam a cultura local; a completa falta de infra-estrutura, como energia elétrica, abastecimento de água e saneamento básico, nos núcleos residenciais; a falta de acesso a programas de saúde; e a marginalização das questões quilombolas nas políticas públicas do governo federal até 2002.

O Programa Brasil Quilombola, criado em 2004

 Coordenado pela Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, objetiva a reversão desse quadro e representa a primeira inclusão de políticas públicas específicas para comunidades quilombolas no Plano Plurianual. As demandas dessas comunidades ressaltam a imprescindível política de identificação, titulação e proteção das terras quilombolas, o fomento ao desenvolvimento econômico, a melhoria do acesso aos programas de saúde, a urgência por ações nas áreas de educação e capacitação profissional e a implementação de políticas de preservação do patrimônio cultural. Diante dos conflitos e disputas em terras quilombolas, sugeriu-se o prazo – final de 2007 – para conclusão dos processos de identificação, demarcação e regularização fundiária. Por outro lado, são necessárias políticas de proteção dessas terras, por meio de mecanismos de denúncia e apuração de abusos, assim como a ampla divulgação de todos esses processos pelos meios de comunicação. Visando ao fortalecimento da auto-sustentabilidade financeira, cultural e ambiental das comunidades, foram estabelecidas como prioridades a facilitação do acesso a créditos, mediante criação de financiamentos específicos, a assistência técnica permanente para agricultura, o investimento na produção e comercialização da agricultura familiar, a implantação de programas sociais e de educação ambiental e a promoção de cursos de capacitação, formação e profissionalização, especialmente para jovens e mulheres. As discussões relacionadas à saúde revelam a necessidade da melhoria de acesso aos programas do governo federal, em especial, ao Programa de Saúde da Família. Contudo, é necessário ressaltar as especificidades ambientais, culturais, sociais e genéticas da população quilombola, visando à capacitação de médicos e de agentes comunitários de saúde para melhoria de eficiência das políticas públicas. As crianças, as mulheres e os idosos são vistos como grupos especiais, que necessitam de assistência diferenciada. A educação teve especial importância nas discussões, com indicação de políticas públicas de resgate da cultura quilombola, mediante construção e fortalecimento de centros culturais, além da implantação de creches e escolas para ensinos fundamental, médio e superior. Espera-se uma escola que se configure como local de resistência e disseminação do conhecimento tradicional e da cultura popular quilombola, ministrando um ensino voltado para a realidade das comunidades, com retomada e revitalização das manifestações culturais: músicas, danças, capoeira e brincadeiras tradicionais. Para isso, deve-se garantir um quadro efetivo de professores capacitados, prioritariamente oriundos das próprias comunidades, que saibam valorizar a história, a tradição e a sabedoria dos remanescentes de quilombos. Considerando que a identidade étnica dos quilombolas está representada em seus elementos linguísticos, religiosos, culturais, em sua organização político-social, e que a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 216, declara tombados todos os documentos e sítios detentores de reminiscências de quilombos, torna-se clara a necessidade de uma política mais incisiva de preservação e revitalização do patrimônio cultural das comunidades, passando pelo processo de inventário e tombamento de sua riqueza material e imaterial, sobretudo das reminiscências arqueológicas. Discute-se também um maior incentivo às manifestações artísticas da cultura negra quilombola.

Quilombolas
73. Criar programas especiais de alfabetização de jovens e adultos nas comunidades quilombolas, com a oferta de monitores e educadores contratados pelo Estado e conteúdo contextualizado.
74. Divulgar e monitorar as verbas destinadas à merenda escolar para quilombolas, bem como a fiscalização quanto a sua qualidade e tempo de validade.
75. Garantir participação dos quilombolas na criação,sistematização e registro da própria história, na construção dos materiais didáticos pedagógicos utilizados nas escolas quilombolas.
76. Criar escolas técnicas agrícolas nas comunidades quilombolas e ampliar as existentes.
77. Criar bibliotecas comunitárias nas comunidades quilombolas.
78. Articular junto aos órgãos competentes a aquisição e manutenção de equipamentos, materiais e ambiente adequados para o desenvolvimento de uma educação de qualidade nas áreas quilombolas.
79. Providenciar equipamentos de segurança e transporte escolar de qualidade às crianças e jovens quilombolas.
80. Construir centros de educação infantil com a formação de educadores oriundos da própria comunidade.
81.  ficar e incentivar os professores para trabalharem em educação especial nas comunidades quilombolas. Povos indígenas
82. Aprimorar o estabelecimento de políticas públicas diferenciadas para a educação dos povos indígenas, definindo as competências de cada ente da Federação.
83. Desenvolver ações afirmativas, em articulação com outros órgãos, para garantir o acesso dos povos indígenas às universidades, em todas as áreas do conhecimento, conforme o perfil e vocação do estudante indígena, e criar casas do estudante indígena nas cidades, com a devida infra-estrutura.
84. Desenvolver ações para que a construção de escolas nos territórios indígenas respeite os usos, costumes e tradições de cada etnia, nas esferas municipal, estadual e federal.
85. Buscar mecanismos junto ao MEC para criar marcos legais para a Educação Superior dos Povos
Indígenas, com a participação destes e de suas organizações na elaboração e implementação dos
mecanismos legais, políticos e administrativos em todos os níveis.
86. Criar mecanismos para desenvolver, com a participação dos povos indígenas e suas
organizações, políticas públicas de educação escolar indígena em centros urbanos.
87. Buscar mecanismos para que as políticas públicas de educação escolar dos povos indígenas
respeitem e implementem o direito de autodeterminação e a autonomia desses povos para buscar livremente o desenvolvimento social e cultural, nos termos dos artigos 3º, 4º e 5º da Declaração da ONU sobre Direitos Indígenas e do artigo 6º da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
88. Buscar melhor qualidade de ensino para a população indígena na educação básica e superior, garantindo alimentação escolar diferenciada e capacitando professores e alunos da própria comunidade.
89. Exigir o cumprimento da Lei n° 2.172, do Plano Nacional de Educação específico para educação dos povos indígenas, da Portaria Interministerial n° 559, de 16 de abril de 1991, garantindo a escola indígena diferenciada, e da Resolução n° 382/2003, que cria a categoria de educação indígena; e aumentar a oferta de vagas para indígenas ao ensino superior garantindo a permanência dos mesmos, nas universidades por meio de programas de bolsas de estudos.
Povos de etnia cigana
90. Garantir o acesso dos povos de etnia cigana à educação de qualidade, em todos os níveis de ensino, de forma continuada e permanente, em seus territórios ou próximo a estes, conforme a necessidade de cada comunidade,em condições apropriadas de in fra-estrutura, recursos humanos, equipamentos e materiais.
91. Promover e criar cursos de alfabetização diferenciada às crianças e adultos ciganos através
de unidades móveis, com programas e pro fissionais capacitados para uma alfabetização rápida e eficaz, com representatividade nos conselhos federais, estaduais e municipais de defesa dos direitos das minorias étnicas, nos conselhos tutelares, bem como no Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, para orientação, resguardo e garantia dos direitos dos povos de etnia cigana.
92. Incluir a história da cultura cigana no currículo escolar, nos diversos níveis de ensino.
93. Desenvolver campanhas com o objetivo de incentivar a comunidade cigana a permitir que as meninas ciganas tenham o mesmo direito que os meninos ciganos à alfabetização, cultura e educação.
94. Promover para as comunidades ciganas a mesma prerrogativa de direito contida na Lei n° 6.533/78, Artigo 29, que garante a matrícula nas escolas públicas àqueles que exercem atividade itinerante.
95. Formar os professores do ensino fundamental e médio para prevenir discriminações e garantir a educação escolar diferenciada às crianças ciganas, respeitando suas crenças costumes e tradições.
96. Iniciar o projeto “Cartão Educação”, para que as crianças e adolescentes ciganas sejam matriculadas no máximo em 24 horas nas redes públicas estaduais e municipais, sempre que chegarem com suas famílias em uma nova cidade.
97. Promover campanhas educativas e elaborar material didático relacionado à etnia cigana, para divulgação em escolas públicas municipais e estaduais.Eliminar dos materiais didáticos expressões que apresentem a etnia cigana de maneira difamatória.
Educação e Cultura
98. Articular a construção e manutenção de centros educacionais, esportivos e culturais, com a função de preservar e difundir o patrimônio imaterial das culturas africanas, a fro-brasileira e dos povos indígenas.
99. Adotar a capoeira angola e regional nas diferentes práticas educacionais e desportivas, em âmbito municipal, estadual e federal, estimulando a realização de encontros, festivais, competições e eventos culturais, incentivando as escolas a adotar, em atividades extracurriculares, a prática da capoeira, angola e regional, ministrada por um profissional habilitado por saber notório, adquirido e comprovado por atuação e reconhecimento da comunidade.
100. Articular a garantia de verbas orçamentárias federais, estaduais e municipais para implementar Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Africana, Afro brasileira e Indígena, segundo as leis n° 10.639/ 2003 e n° 11.645/ 2008, como também programas e projetos estimulando novas iniciativas referentes ao aprimoramento dos currículos e formações dos profissionais na área da Educação
101. Estimular a criação de linhas de financiamento pelas universidades e demais órgãos para a criação de grupos de estudo e pesquisa com recorte étnico-racial e diversidade sexual, em regime de colaboração.
15. Garantir às comunidades tradicionais a ampliação e o acesso à infra-estrutura de comunicação, por meio da instalação de orelhões e telecentros de inclusão digital.
16. Destinar recursos para a infraestrutura física e produtiva das comunidades negras e comunidades tradicionais, priorizando obras de saneamento básico, instalação de redes de distribuição de energia,
melhoria dos acessos, construção e ampliação das moradias, construção de módulos sanitários, bem como ações de preservação ambiental, incluindo a coleta seletiva de lixo.
17. Criar programa governamental para a construção e reforma de terreiros, casas ou templos das religiões de matriz africana e afro brasileira, e assegurar infraestrutura para os acampamentos de povos ciganos e indígenas quando estiverem migrando para a comercialização de suas produções.
18. Construir espaços de esporte e lazer comunitários objetivando a integração social e a profissionalização dos jovens de 7 a 17 anos nas diversas modalidades esportivas, bem como a valorização das culturas dos diversos segmentos de povos e comunidades tradicionais nas áreas rurais e urbanas.
19. Criação de museus multiétnicos que permitam maior visibilidade à história e cultura afro-brasileira, indígena e cigana, prestando orientação e apoio às organizações sociais desses segmentos.
20. Fortalecer a concepção de desenvolvimento sustentável e a preservação do meio ambiente no
âmbito do movimento negro.
21. Fortalecer os programas de infraestrutura destinados aos povos e comunidades tradicionais, dentre os quais a construção de moradias, atendimento de saúde, acesso à cultura , desenvolvimento tecnológico e educacional, com conteúdos e metodologias que garantam as especificidades de cada segmento, bem como criar o sistema único de transporte com tarifa zero.
22. Definir políticas de estímulo à agricultura familiar para a soberania alimentar e nutricional sustentável dos povos e comunidades tradicionais.
23. Favorecer o desenvolvimento socioeconômico dos povos e comunidades tradicionais por meio de uma política de geração de renda através do turismo sustentável e das apresentações artístico-culturais.
24. Realizar mapeamento georreferenciado, capacitação técnica e dotar de infra-estrutura os povos
e comunidades tradicionais de forma a possibilitar condições reais de sustentabilidade e de permanência no campo observando suas tradições.
25. Criar mecanismos para avaliar e ampliar o programa de cestas básicas para os povos e comunidades tradicionais, de forma a acelerar e melhorar o processo de distribuição.
26. Criar mecanismos para o fortalecimento institucional das comunidades tradicionais, de forma a possibilitar que se articulem junto aos governantes e representantes eleitos para defesa de seus direitos.
27. Ampliar as políticas de investimento para transferência da tecnologia entre os ministérios ou instituições públicas – tais como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Empresa de Assistência Técnica e Extensão
Rural (EMATER), e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) – e todos os órgãos financiadores às comunidades tradicionais, como forma de propiciar sustentabilidade dos projetos desenvolvidos nas respectivas áreas; bem como incentivar os gestores municipais, estaduais e federais a assumirem compromisso de implementar projetos com essas especificidades.
28. Reconhecer, por meio da formulação de políticas e de metas institucionais, a necessidade de compensação das desvantagens históricas do povo negro e da valorização artística e cultural como estratégias de afirmação étnica e realização do direito à igualdade.
29. Criar e promover políticas públicas na área de saúde, educação, meio ambiente, combate a fome e geração de renda nas comunidades de terreiros de todo o país

Comunidades tradicionais e sua contribuição para a sustentabilidade

 Este trabalho é parte de uma pesquisa bibliográfica que tem por meta investigar as contribuições das comunidades tradicionais no desenvolvimento sustentável do nosso planeta. No Brasil, as comunidades tradicionais ocupam cerca de 25% do território e correspondem, aproximadamente, a 4,5 milhões de pessoas. Sendo que destes, temos dois milhões de quilombolas, um milhão de atingidos por barragens, 435 mil indígenas, 400 mil quebradeiras de coco e babaçu, 37 mil seringueiros e 163 mil castanheiros (BRASIL, 2006). Esses povos detêm uma gama de conhecimento sobre a natureza e um legado cultural que é transmitido ao longo de várias gerações. A convivência com os recursos naturais acontece de forma sustentável, pois os elementos da natureza possuem um valor simbólico que ultrapassa o comercial. Desta forma, tudo que o cerca é considerado sagrado e a utilização dos recursos ocorre apenas para sua subsistência.  Almeida (2008) acrescenta, além destes, os faxinalenses, comunidades de fundo de pasto, pomeranos, ciganos, giralzeiros, vazanteiros, piaçabeiros, pescadores, artesanais, pantaneiros, afro-religiosos, peconheiros e outros sujeitos sociais emergentes que possuem identidades coletivas fundamentadas em direitos territoriais e numa autoconsciência cultural. Para Boff (2004), “em todas as partes da Terra existem ainda povos originários que vivem a dimensão do sagrado e da re-ligação com todas as coisas”. As comunidades tradicionais, a partir do Decreto nº 6040, de 7/02/2007, foram entendidas como grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais. Possuem formas próprias de organização social, ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando ainda conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição. Os mesmos são vítimas da exploração sociocultural desde a colonização, quando o colonizador acreditava que os nativos e negros trazidos da África eram inferiores, sendo tratados como objetos apenas para satisfazer as suas necessidades. Pior. Tais “Ações criaram cicatrizes e tem influencia direta na formação do povo brasileiro: Estas comunidades sempre sofreram com o processo histórico de exploração sociocultural. Exploração esta que é trazida como uma trágica herança cultural, de um povo colonizado, escravizado e servidor. [...] Povo este que, [...] é mais do que um transmissor dos modos de vida na beira do rio, e sim os nervos e músculos formadores da sociedade atual, que continua a explorar esta gente, trazendo para elas o progresso e levando consigo, ou ainda, destruindo, ambientes, povos, pessoas e culturas”. (OLIVEIRA, 2009).  Com a evolução científica e tecnológica a sociedade passou ainda mais a ter estes povos com desprezo, inferiores e distantes da civilização. Só mediante inúmeros conflitos e manifestações sociais, vem-se tendo uma nova conscientização frente às comunidades tradicionais: “A repetida inovação de “modernidade” e “progresso”, que parecia justificar que os agentes sociais atingidos pelos “grandes projetos” fossem menosprezados ou tratados etnocentricamente como “primitivos” e sob o rótulo de “atrasado”, tem sido abalado face à gravidade de conflitos prolongados e à eficácia dos movimentos sociais e das entidades ambientalistas em impor novos critérios de consciência ambiental”. (ALMEIDA, 2008).
Também mobilizações e conflitos em nível local, nacional e mesmo internacionais, têm tido resultados perspicazes, haja vista que alguns direitos começam a ser reconhecidos. Isso demonstra bem como movimentos sociais têm sido importantes na luta pelos direitos dos povos tradicionais: “Esses grupos tradicionais, conhecidos como “minorias étnicas”, sofreram ao longo da história do Brasil diferentes formas de preconceitos e discriminação, culminando com a absoluta negação de seus direitos. Porém, após a III Conferência das Nações Unidas Contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlata, realizada em Durban, [...] que tipifica as formas de racismo e discriminação racial existentes no mundo, estabelecendo um programa de ações a ser cumprido pelos países membros. 
Na atualidade é comum vermos vários grupos tornarem-se refugiados ambientais, vítimas dessas decisões”. (MARQUES, 2009). Concernente aos conhecimentos adquiridos por estes distintos povos ao longo dos anos, Boff (2004) exclama: “o conhecimento tradicional é uma sabedoria feita da observação e da ausculta da Terra”. Esses ainda são determinantes para a manutenção do equilíbrio existente entre estas populações e a natureza; já que sua sobrevivência depende da manutenção dos recursos naturais. A disputa pela apropriação dos conhecimentos acumulados ao longo de várias gerações se dá inclusive em nível internacional: “No plano internacional, a biodiversidade tornou-se objeto de intensa disputa e extrapola o campo dos recursos biológicos, da agricultura e da alimentação, pois o campo de luta não é mais a apropriação do território em si, mas o acesso e o controle do conhecimento. O que está em jogo é a defesa do direito de continuar mantendo uma conexão vital entre a produção de alimentos e a terra. Impossível proteger a diversidade biológica sem proteger, concomitantemente, a sociodiversidade que a produz e conserva. [...]”. (CASTRO, 2000).  Ideologicamente, os conhecimentos tradicionais são geralmente considerados folclóricos, até mesmo como forma de menosprezar toda uma gama de experiências centenárias que vão desde a forma peculiar de usos da terra como seu cultivo e manejo, até a extração e convívio de forma estável com os elementos da natureza. No entanto, a tentativa de patentear os bens e saberes nativos, devastar as florestas e usurpar os mais diversos recursos, tem provocado inúmeros conflitos ambientais, já que é impossível pensar no meio ambiente sem a preocupação com as comunidades locais, pois estas necessitam da conservação do ambiente para sua sobrevivência. Um aspecto plausível no seio dos mais distintos povos tradicionais atualmente se dá pela formação de uma consciência ecológica em prol do equilíbrio autossustentável: prova são as constantes lutas contra a apropriação de seus bens e saberes os quais são retirados de forma agressiva sem o devido respeito com a natureza. Tem-se aqui uma biopirataria: “Considere-se “biopirataria” ou “pirataria ecológica” um conjunto de práticas delituosas que tanto consistem em transportar animais ou plumas, sem a permissão legal, com o objetivo de usar o material genético coletado para fins comerciais, quanto em usurpar os conhecimentos tradicionais de povos indígenas e camponeses sobre animais e plantas”. (ALMEIDA, 2008).  As comunidades tradicionais contribuem, ainda, para a conservação do equilíbrio ecológico pois na maioria das vezes tais povos reconhecem a natureza como ser vivo sagrado. Dessa forma eles respeitam, cuidam, valorizam e convivem em harmonia. Quanto ao papel das comunidades na conservação da biodiversidade, Oliveira (2009) bem relata: “culturas e saberes tradicionais contribuem para a manutenção da biodiversidade dos ecossistemas. Em numerosas situações, na verdade, esses saberes são o resultado de uma evolução conjunta entre as sociedades e seus territórios, o que permitiu um equilíbrio entre ambos”. Boff (2004) entende ainda que só conseguiremos mudar nossas atitudes frentes aos problemas ambientais quando recuperarmos o sagrado: “Esse sagrado assumido nos faz voltar de nosso exílio e despertar de nossa alienação. [...] E começamos a tratar a Terra, cada coisa dentro dela e o inteiro universo como tratamos nosso corpo, cada órgão nosso, cada emoção de nossa alma e cada pensamento de nossa mente. Somente uma relação pessoal com a Terra nos faz amá-la. E a quem amamos também não exploramos, mas respeitamos e veneramos”. (BOFF, 2004).  Assim, as comunidades tradicionais desempenham papel crucial no desenvolvimento sustentável do planeta, já que seus conhecimentos e expressões, antes considerados artesanais, pré-industriais ou limitados, têm se tornado eficaz na luta contra o desmatamento e a exploração em larga escala dos recursos naturais, praticando estas comunidades uma convivência estável para com sua moradia maior: o planeta Terra.

DIREITOS DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS: DIREITOS HUMANOS E SUJEITOS COLETIVOS DE DIREITO
 A Constituição Federal (1988) expressa direitos individuais e meta individuais, reconhecendo sujeitos coletivos de direito (comunidades indígenas e remanescentes de quilombo, povos de santo, pescadores artesanais e marisqueiras, fundo de pasto, geraiszeiros, quebradoras de coco-babaçu, seringueiros) e incorporando direitos humanos, relativos à diversidade étnica, direitos culturais, ao meio ambiente, a territorialidade, a autonomia, a livre determinação, além dos direitos fundamentais, como educação, saúde, moradia, alimentação.  As conquistas garantidas no sistema legal foram resultado da luta e afirmação das comunidades, historicamente marginalizadas no acesso à cidadania. No dizer de Boaventura de Sousa Santos existe um processo de reconhecimento de novos direitos que vêm sendo garantidos em “sistemas jurídicos constitucionais, antes fechados ao reconhecimento da pluriculturalidade e multietnicidade, foram reconhecendo, um a um (…) uma variada formação étnica e cultural” (2003:93).
O novo sujeito histórico coletivo articula-se nas exigências de dignidade, de participação, de satisfação “mais justa e igualitária das necessidades humanas fundamentais de grandes parcelas sociais excluídas, dominadas e exploradas da sociedade” (Wolkmer, 2005: 104). Por sua vez,  “a história do povo revela que há diversidades raciais que são criadas e recriadas no interior das desigualdades sociais (Ianni, 2004:07). No fazer-acontecer da norma constitucional políticas sociais diferenciadas com participação das comunidades têm sido elaboradas e os governos federais e estaduais têm institucionalizado estruturas administrativas de Estado, como Ministérios, Secretarias e instâncias colegiadas, como a Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto de 24 de dezembro de 2004, Decreto 13 de julho de 2006 e Decreto 6040, de 07 de fevereiro de 2007).
Portanto, a partir de 2007, com a estruturação nacional de povos e comunidades tradicionais, uma diversidade de grupos étnico-raciais sai de uma nítida invisibilidade institucional.  Tal invisibilidade se refletia “pela ausência de instância do poder público responsáveis pela articulação e implementação de políticas para esses povos e comunidades” (Silva:2007:07). A própria conceituação normativa dessas comunidades é estabelecida, como sendo:“Grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição” (Decreto 6040, de 07 de fevereiro de 2007, art. 3, I). Os povos e comunidades tradicionais têm construído ao longo de gerações sistemas sustentáveis de exploração dos bens ambientais, adaptados às condições ecológicas e baseada em saberes que respeitam a diversidade biológica, explicitam harmonia com a natureza e efetivam culturas de subsistência. Por sua vez, existem demandas por direitos das comunidades tradicionais ainda não plenamente realizadas, quer por déficits históricos, pela falta de interesses das elites e falta de preparo estatal para atendimento dos pleitos, pela ausência de formação jurídica específica de profissionais egressos dos cursos jurídicos, pelo tempo dispendido nos processos de reconhecimento e titulação de terras, por dificuldades de mediação dos conflitos existentes, inclusive pela inserção de temas atuais, como o racismo institucional, ambiental e a intolerância religiosa. Em verdade existe “a necessidade de construir a perspectiva de um sistema democrático que incorpore a noção de diversidade de classe e de raça” (Rocha & Santana Filho, 2008: 39). Atualmente os povos e comunidades tradicionais sofrem pressão intensa para conquista dos seus territórios, a exemplo dos povosGuarani-kaiowa e dos kaiapós.
MULHER NEGRA
A intensa participação das mulheres na política, na economia, na educação e em tantas outras áreas tem dado visibilidade à sua história. Em 2004, no período de  15 a 17 de julho, mulheres do Brasil inteiro reuniram-se em Brasília para a I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, realizada pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. O resultado da Conferência das Mulheres foi a elaboração do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, com a incorporação da dimensão racial, considerando os princípios igualdade e respeito à diversidade; eqüidade; autonomia das mulheres; justiça, participação e controle social. Todas as discussões e princípios ressaltam que mulheres e homens são iguais em seus direitos, demandando o combate às desigualdades de toda sorte, por meio de políticas de ações afirmativas, e a consideração das experiências das mulheres na formulação, implementação, monitoramento e avaliação das políticas públicas. Na I Conapir, as discussões sobre as condições de vida e de desenvolvimento das mulheres negras tiveram como elemento básico o Plano de Política para Mulheres. Mulheres negras, quilombolas, indígenas e ciganas destacaram os seguintes pressupostos, princípios e diretrizes gerais para uma política pública equânime: autonomia e igualdade no mundo do trabalho; educação inclusiva, não sexista, universal e transversal; saúde das mulheres, direitos sexuais e reprodutivos e enfrentamento da violência contra mulheres. As participantes salientaram a importância do combate efetivo, por meio de políticas públicas, dos mecanismos de reprodução da discriminação, do racismo e das desigualdades raciais no tocante à mulher negra no mercado de trabalho e para geração de renda. As propostas também visavam à criação de mecanismos de fiscalização quanto às práticas de assédio sexual, discriminações raciais e por orientação sexual na ocupação de vagas no mercado de trabalho. A saída proposta foi a defesa das políticas de ações afirmativas em todas as esferas de trabalho como forma de promover a igualdade salarial e os direitos de promoção, em todas as instâncias do mercado de trabalho, para negras, e também o estímulo à profissionalização da mulher trabalhadora rural, quilombola e indígena, garantindo linhas de créditos, facilitando o acesso à previdência rural e aos programas de reforma agrária e urbana. Em relação às trabalhadoras domésticas, as propostas foram várias, tais como: campanhas conjuntas entre poder público e sindicatos, com o objetivo de combater a informalidade da mulher trabalhadora, em especial a trabalhadora doméstica; promover o fortalecimento da capacidade gerencial, técnica e profissional das mulheres negras, indígenas e quilombolas, com recorte geracional, visando à paulatina redução do peso do emprego doméstico na população ocupada desse contingente; o pagamento obrigatório do FGTS, por parte do empregador, para as empregadas domésticas e alteração na legislação do imposto de renda para que os gastos realizados com o pagamento da empregada doméstica sejam deduzidos no cálculo do imposto de renda das pessoas físicas, desde que o empregador registre a empregada e recolha, mensalmente, o INSS e o FGTS. A temática saúde da mulher demonstrou a busca pela garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, considerando o recorte de raça/etnia. Foram aprovadas as emendas referentes à implementação de projetos de intervenções sobre 97os agravos na saúde das mulheres negras, quilombolas, indígenas e ciganas residentes no campo e na cidade; a ampliação dos programas de prevenção à diversas doenças; a implantação de atendimento hospitalar humanizado à mulher negra usuária do Sistema Único de Saúde; a introdução de metas específicas no Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, visando à eliminação das desigualdades raciais nas taxas de mortalidade materna; e a revisão da legislação punitiva que trata da interrupção voluntária da gravidez, visto que é sobre as mulheres negras e pobres que pesa o preço da ilegalidade: morbidade e mortalidade materna. As propostas para a consolidação de uma política de enfrentamento da violência contra as mulheres foram consideradas fundamentais para garantir qualidade de vida com dignidade para mulheres negras, indígenas, quilombolas e ciganas, especialmente a violência doméstica. Enfim, uma política de igualdade racial deve ter a premissa da transversalidade, para que a proteção aos direitos e a garantia de equidade não se restrinja a uma parcela da população, desconsiderando as mulheres como sujeitos da história, da política e da cultura nacional.
RELIGIÕES DE MATRIZ AFRICANA – COMUNIDADES DE TERREIRO

O Estado brasileiro não pode desconsiderar o papel histórico e a contribuição que as religiões de matriz africana tiveram na formação da identidade e costumes do povo brasileiro, proporcionados pela chegada de milhares de africanos escravizados trazidos ao país. Essa população que, no confronto com o padrão dominante aqui existente, introduz e reproduz os valores e saberes da visão de mundo africana, reelaborando e sintetizando no Brasil a relação do homem com o sagrado. A constante afirmação dessa filosofia foi fundamental para a sobrevivência física e cultural dos vários grupos originários do continente africano. As comunidades de terreiros constituem-se como espaços próprios, mantenedores de uma perspectiva de mundo baseada em valores, símbolos e traços culturais que expressam um sistema de idéias de ancestrais africanos em nosso país. Dessa forma, também influenciam fortemente o cotidiano da vida nacional ao apresentarem novas formas de estabelecimento de relações sociais, políticas, econômicas e humanas, ao buscarem convivência harmônica com a natureza e apostar na construção coletiva do espaço social. A vida do povo brasileiro é permeada das ricas contribuições da cultura africana e já se reconhece que a religiosidade de matriz africana influenciou essas manifestações, seja na música, no vocabulário, nos costumes e em muitas outras áreas. A Constituição Federal brasileira, promulgada em 1988, fixou a proibição de discriminação na liberdade de crença, quando afirma no seu artigo 5°, inciso sexto, que é inviolável a liberdade de consciência e crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias. É urgente considerar a importância do papel desenvolvido por essas comunidades e que isso seja levado em consideração no momento de formulação e implementação de políticas públicas desenvolvidas pelo Estado. Não cabe mais o preconceito e a discriminação em relação a religiões de matriz africana e a qualquer outra opção religiosa. A Carta Magna é explícita e assegura aos seus cidadãos o direito à livre manifestação religiosa, o que a lei deve garantir rigorosamente. Nesse sentido, a Justiça, por meio do Ministério Público Federal, tem a missão de efetivar esse direito, não permitindo atos e posturas de intolerância religiosa em qualquer espaço da sociedade brasileira, os quais sobrevivem nos dias de hoje à sombra da impunidade. Durante a Conferência, a discussão sobre as Religiões de Matriz Africana, evidenciou a necessidade de reconhecimento da importância do segmento e da dívida histórica do Estado Brasileiro, uma vez que essa história foi marcada pela perseguição às suas manifestações, territórios, objetos sagrados e seguidores. A política abrange a garantia de respeito e a legitimidade social das sacerdotisas, sacerdotes, pajés e xamãs, por meio do direito assegurado de acesso aos espaços públicos, fóruns e participação em cerimônias ecumênicas; a proposição 106 de uma legislação que defina e puna atos discriminatórios relativos à intolerância étnico-religiosa; políticas públicas de resgate e preservação do patrimônio cultural e material e de resguardo da religiosidade afro-descendente e da espiritualidade indígena; e ações que assegurem a regularização e o tombamento dos espaços ocupados pelas comunidades de terreiro, além do respeito à liberdade de expressão das crenças de matrizes africanas, indígenas, de ciganos, muçulmanos e judeus, garantindo a utilização das áreas tradicionais e o uso de objetos sagrados em todo e qualquer lugar. Para o fortalecimento das religiões de matriz africana, foi levantada a necessidade de ações que proporcionem a estruturação, politização e maior organização e afirmação, tais como a ampliação da sustentabilidade das comunidades, o seu reconhecimento como um centro irradiador de promoção de políticas públicas, a sua participação nos projetos sociais, a criação de uma rede de apoio, a promoção de intercâmbios entre as comunidades de terreiro e o incentivo às oficinas, seminários, cursos de formação nos terreiros. Enfim, a participação dos religiosos e religiosas de matriz africana nas várias etapas da I Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial foi fundamental para debater as particularidades desse importante grupo social em conjunto com a sociedade, e apresentar uma grade de proposições que, em última análise, pedem o respeito à sua fé e tradição religiosa, merecendo um lugar especial na Política de Promoção da Igualdade Racial.

PROPOSTAS
I – Diretrizes gerais
1. Reconhecer a dívida com os líderes e seguidores das religiões de matriz africana, pelos séculos de perseguição perpetrados a essa forma de manifestação religiosa, seus territórios, objetos sagrados e aos seus adeptos e envidar todos os esforços no sentido de superar as formas de estereótipos que ainda se mantêm, bem como lhes conferir direitos idênticos aos das demais religiões e fortalecer os mecanismos legais que punam exemplarmente as ações segregatórias e discriminatórias.
2. Garantir o respeito do Estado à existência de terreiros de umbanda e candomblé.
3. Reconhecer as sacerdotisas e sacerdotes das religiões de matriz africana, assim como os pajés e xamãs, assegurando a respeitabilidade e legitimidade social das funções por eles(as) desenvolvidas. Garantir seu livre acesso a cemitérios, hospitais e presídios, nas mesmas condições dos demais representantes religiosos.
4. Combater a intolerância religiosa e assegurar, no Plano Nacional de Direitos Humanos, a inclusão de legislações que definam e punam a intolerância étnicoreligiosa, a discriminação e o preconceito contra as religiões, de modo a dar cumprimento ao preceito constitucional que assegura o livre exercício da fé e da coletividade afro-descendente e indígena.
5. Regulamentar e implementar o artigo 20 da lei nº 7716, de 05 de janeiro de 1989, que garante a punição de atos discriminatórios, por parte de grupos religiosos, à prática das religiões de matriz africana.
6. Assinar e ratificar a declaração para a eliminação de todas as formas de intolerância e discriminação fundadas em religião ou crença (OEA, 1981).
7. Fomentar o respeito e o reconhecimento das diversas religiosidades, especificamente da religião afro-descendente, garantindo o cumprimento da lei de liberdade de credo: o direito de professar e praticar uma religião, possuir e utilizar símbolos sagrados, trajes religiosos e utilizar espaços públicos para cultos e atividades afins.
8. Cumprir a legislação internacional e nacional referente à discriminação e/ou ao preconceito com as religiões de matriz africana, revisando a concessão de rádios e televisões que veiculem em seus programas a intolerância religiosa, o trato pejorativo, o desrespeito e a perseguição à religião de matriz africana.
9. Criar política de incentivo à valorização das diversas culturas e religiões das comunidades quilombolas e indígenas e criar espaços físicos para manifestações em suas próprias comunidades.
10.Criar mecanismos de combate a todo tipo de discriminação nos terreiros: por orientação sexual (GLBTT), condição socioeconômica ou raça, partindo do pressuposto de que o terreiro é um espaço que acolhe a diversidade.
11.Reconhecer a participação das religiões de matriz africana no cenário político e social do país, incluindo os religiosos de matriz africana nos espaços e fóruns públicos e nas cerimônias ecumênicas.
12.Garantir que as conferências de promoção da igualdade racial sejam uma oportunidade para que os afro-brasileiros(as), indígenas e outras etnias discriminadas combatam o racismo e a xenofobia.
13.Fazer cumprir o caráter laico do Estado brasileiro, retirando os símbolos religiosos dos estabelecimentos públicos.
14.Estimular que estados e municípios solicitem audiências públicas sobre a intolerância religiosa com as promotorias ambientais, o legislativo e as secretarias de justiça, do meio ambiente e de direitos humanos.
15.Estabelecer um fórum permanente contra a intolerância religiosa e pela diversidade.
II – Fortalecimento das religiões de matriz africana
16.Promover, com subsídios da Seppir, o intercâmbio e a integração dos terreiros de matriz africana, com o objetivo de potencializar ação coletiva que coíba a intolerância.
17.Subsidiar ações que proporcionem estruturação, politização e maior organicidade e afirmação às religiões de matriz africana.
18.Incentivar e apoiar oficinas, seminários, cursos de formação com e para as comunidades de terreiro.
19.Promover assessoria e informação para os religiosos de matriz africana nas áreas de direito e educação ambiental.
20.Fazer valer os instrumentos normativos de combate à descaracterização dos valores culturais dos afro-brasileiros e o fortalecimento da umbanda e do candomblé.
21.Estimular a criação de uma rede de apoio às religiões de matriz africana constituída por organizações da sociedade civil e dos poderes Legislativo e Judiciário. III – Políticas Públicas
22.Desenvolver políticas públicas para ampliar a sustentabilidade das comunidades de terreiros, levando em consideração a natureza do trabalho desenvolvido nesses espaços e garantindo iniciativas com incentivo concreto do poder constituído nas áreas de saúde, educação, meio ambiente, geração de emprego e renda e cultura.
23.Reconhecer os espaços dos terreiros de candomblé, de religiosidade indígena e de outros grupos discriminados como irradiadores de políticas públicas, disponibilizando para essas comunidades recursos públicos destinados à promoção, desenvolvimento, fomento, resgate e preservação desses espaços e de sua função social.
24.Promover ações afirmativas às religiões de matriz africana compreendendo regulamentação jurídica, posse de terra e intercâmbio com os países africanos e da diáspora africana.
25.Reconhecer a importância das tradições de matriz africana na preservação, manutenção e conscientização da saúde física e mental das pessoas e comunidades em seu entorno, assegurando-lhes condições para sua atuação.
26.Garantir a participação igualitária das casas religiosas de matriz africana nos projetos sociais desenvolvidos pelos órgãos governamentais, sem monopólio, simpatias, preferências e opções pessoais.
IV – Educação
27.Incluir na grade curricular dos níveis superior e médio os idiomas africanos iorubá e quimbundo.
28.Cumprir o que estabelece o artigo 33 da Lei de Diretrizes e Base no que se refere à pluralidade religiosa nas escolas, efetivando os parâmetros que dizem respeito à diversidade religiosa na educação formal e na formação dos educadores.
29.Garantir a implementação de projetos pedagógicos alternativos no espaço de terreiro, utilizando-o para o desenvolvimento de atividades de educação.
30.Destinar verbas para estabelecimento de espaços de referência religiosa das culturas afro-descendentes, indígenas, como bibliotecas, memoriais, arquivos, museus e publicações mediante a criação, manutenção, contratação e formação de quadro técnico especializado.
A – Lei 10.639/03
31.Monitorar a implementação da Lei nº 10.639/03, contribuindo para desmistificar e combater a folclorização das religiões afro-brasileiras.
32.Regulamentar dispositivos para o cumprimento da Lei 10.639/03 e da Lei de Diretrizes e Base da Educação, incorporando a questão da diversidade cultural e religiosa desde a educação infantil até às universidades, valorizando a história e cultura das diversas etnias africanas e ameríndia.
33.Assegurar a participação de religiosos de matriz africana na formação e capacitação dos educadores, inclusive os de nível superior, como também na elaboração de materiais didáticos a serem adotados de acordo com a Lei nº 10.639/03.
B – Saberes
34.Valorizar o saber adquirido pela transmissão oral do conhecimento, pela vivência e experiência no interior das comunidades de terreiros.
35.Apoiar e incentivar as mulheres benzedeiras, parteiras, curandeiras e rezadeiras.
V – Espaço e meio ambiente
36.Promover políticas que assegurem a criação, o estabelecimento e a manutenção de reservas ambientais, rurais, urbanas e herbários etnobotânicos, segundo os padrões originários das cosmovisões africanas, objetivando a guarda e proteção de seus ecossistemas, como patrimônios inalienáveis e de importância vital para a sociedade, e garantir o desenvolvimento do plantio de árvores sagradas e a produção de folhas e ervas de uso medicinal e sagrado.
37.Assegurar, aos fiéis das religiões de matriz africana, o acesso, a permanência e a utilização de espaços públicos para o ritual.
38.Elaborar projeto de mapeamento das casas religiosas de base africana com vistas ao seu tombamento a partir de critérios negociados com essas comunidades.
39.Criar dispositivos legais que garantam a adoção de políticas públicas de resgate, preservação do patrimônio cultural e material e de resguardo da religiosidade afro-descendente e da espiritualidade indígena.
40.Desenvolver ações para o resgate e legalização dos espaços ocupados pelas comunidades de terreiros.
41.Apoiar a reforma das casas de terreiro, bem como promover a sua ampliação.
42.Garantir o respeito e a liberdade de expressão das crenças ritualísticas indígenas, de matriz africana, de ciganos(as), mulçumanos(as) e judeus(ias), assegurando a utilização de áreas tradicionais e o livre uso e posse de objetos sagrados, conforme preceito constitucional.
43.Garantir a concessão de áreas para construção de terreiros de Umbanda e Candomblé, assim como promover ampliação da área territorial das casas tradicionais de base africana para melhor desenvolvimento de suas funções.
44.Garantir a isenção de impostos para os terreiros, a exemplo do benefício concedido às casas religiosas de outras confissões.
45.Isentar as casas de cultos das religiões de matriz africana do cumprimento da lei do silêncio, considerando sua especificidade.
VI – Controle social
46.Assegurar que a presença e a expressão de líderes religiosos de matriz africana seja equivalente aos demais sacerdotes religiosos que se façam presentes em todo e qualquer evento público.
47.Estimular a criação de vagas aos religiosos de matriz africana nos conselhos de controle e participação social de habitação, educação, saúde, meio ambiente, entre outros.
48.Implementar uma comissão paritária permanente para o diálogo inter-religioso entre a sociedade civil, os entes públicos e as tradições religiosas.
49.Criar um conselho inter-religioso para a promoção de campanhas periódicas, estratégias para a construção do respeito à diversidade religiosa, bem como para recebimento de denúncias de intolerância.
50.Criar programas de formação de multiplicadores da cultura afro-brasileira, indígena e de outras etnias discriminadas para as lideranças comunitárias, com reforço à importância do papel do(a) líder comunitário(a) na temática.
VII – Produção de dados e pesquisas
51.Garantir a inclusão dos campos religiões de matriz africana, indígena e cigana no quesito referente às religiões no censo demográfico (IBGE).
52.Fomentar pesquisa nacional, realizada pelo IBGE, para coletar dados sobre as religiões de matriz africana, buscando mapear e identificar as casas de umbanda, candomblé e demais variantes da religiosidade de matriz africana e criar um banco de dados, a ser disponibilizado nos meios de comunicação, para promover o resgate histórico e cultural dessas comunidades.


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