terça-feira, 29 de dezembro de 2009

LIBERDADE RELIGIOSA - PROJETO DE LEI

Muito se tem discutido nos recentes dias a respeito do Acordo Internacional firmado pelo Brasil e a Santa Sé, assinado pelo Presidente da República quando em visita ao Estado do Vaticano e há poucos dias aprovado pelo Congresso Nacional, como de praxe, nestas circunstâncias, corroborado na letra constitucional, em especial o art.49, ao tratar da competência do Congresso Nacional, quando lhe é atribuído o poder de resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais.Comenta-se de inconstitucionalidades, as mais diversas, constantes do texto do citado Acordo alegando-se afronta ao princípio do Estado laico, prioridade no trato com a religião católica, dentre uma série de outros assuntos paralelos. Em que pese a juridicidade dos argumentos de que se utilizam os comentaristas, devo trazer a discussão outros aspectos que julgo sobremodo importantes, sendo de se ressaltar que a existência do citado Acordo, apesar de seus críticos, cria o ambiente ideal para se discutir, a necessidade de lei que efetivamente regule alguns princípios importantes que possam, de forma clara e evidente garantir a liberdade de culto no Brasil. Na verdade, este Acordo com a Igreja Católica, tem, sobre este aspecto, seus méritos, e significa o primeiro passo de um caminho deveras importante para que em definitivo se assegure a liberdade religiosa no Brasil.Encontra-se no Congresso Nacional o projeto de Lei 5.598, que com este objetivo busca regulamentar a respeito do livre exercício da crença. Em uma avaliação sucinta julgo importante algumas modificações, que entendo poderão ser mais eficientes, conforme os comentários que seguem.PROJETO DE LEI 5598, DE 2009.Dispõe sobre as Garantias e Direitos Fundamentais ao Livre Exercício da Crença e dos Cultos Religiosos, estabelecidos nos incisos VI, VII e VIII do artigo 5º, e no §1° do artigo 210da Constituição da República Federativa do Brasil.Art. 1º Esta lei estabelece mecanismos que asseguram o livre exercício, a proteção aos locais de culto e suas liturgias e a inviolabilidade da crença no país, regulamentando os incisos VI, VII e VII do artigo 5º e o § 1º do artigo210 da Constituição da República Federativa do Brasil.Parágrafo Único. A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável e garantida a todos em conformidade com a Constituição da República Federativa do Brasil, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o direito internacional aplicável e a presente lei.COMENTÁRIO: Tendo em vista a dimensão que se quer para a referida lei, (garantia da liberdade religiosa), é sobremodo importante alinhar o texto à Constituição e as normas legais de âmbito internacional. Daí importante se faz a inserção deste parágrafo único.
Art. 2º É reconhecido às organizações religiosas direito de desempenhar suas atividades, garantindo o livre exercício de suas atividades, observado o ordenamento jurídico brasileiro.COMENTÁRIO: A opção pela utilização do termo organizações religiosas em substituição ao termo instituições religiosas deve-se ao fato de que, já o nosso Código Civil, consagrou o termo organizações religiosas, dessarte, a manutenção desta terminologia evitará certamente a formação de eventuais dificuldades conceituais futuras.
Art. 3º É reconhecida pelo Estado Brasileiro a personalidade jurídica das organizações religiosas desde que não contrarie as exigências constitucionais e as leis brasileiras.§1º As organizações religiosas podem livremente criar, modificar ou extinguir suas instituições inclusive as mencionadas no caput deste artigo.§2º A personalidade jurídica das organizações religiosas é reconhecida pela República Federativa do Brasil mediante a inscrição no respectivo registro do ato de criação, vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro do ato de criação, desde que atendidas as disposições da legislação brasileira, devendo também ser averbadas todas as alterações por que passar o ato.COMENTÁRIO: A ressalva se torna imperiosa na medida em que se resguarda o princípio da legalidade e da ordem pública. Doutra forma, pode-se estar permitindo a legalização de entidades religiosas com práticas de culto que atentam a boa ordem, os bons costumes, e a boa prática social, gerando dificuldades de complexa solução.
Art. 4º As atividades desenvolvidas pelas pessoas jurídicas reconhecidas nos termos do artigo 3° gozarão de todos os direitos, imunidades, isenções e benefícios outros atribuídos às demais entidades de natureza semelhante previstos no ordenamento jurídico brasileiro, atendidos os requisitos e demais obrigações exigidos pela legislação brasileira.COMENTÁRIO: As inserções neste artigo consideradas buscam simplesmente uma maior abrangência na aplicação dos benefícios fiscais, dando a lei, a dimensão teleológica constante da imunidade constitucional garantida aos templos de qualquer culto. 
Art. 5º O patrimônio histórico, artístico e cultural, material e imaterial das organizações religiosas reconhecidas pela República Federativa do Brasil, assim como os documentos custodiados nos seus arquivos e bibliotecas, constitui parte relevante do patrimônio cultural brasileiro, e continuarão a cooperar para salvaguardar, valorizar e promover a fruição dos bens, móveis e imóveis, de propriedade das organizações religiosas que sejam considerados pelo Brasil como parte de seu patrimônio cultural e artístico.§1º A finalidade própria dos bens eclesiásticos mencionados no caput deste artigo deve ser salvaguardada pelo ordenamento jurídico brasileiro, sem prejuízo de outras finalidades que possam surgir da sua natureza cultural.§2º As organizações religiosas comprometem-se a facilitar o acesso a elas para os estudiosos, pesquisadores, cientistas sociais e demais intelectuais, salvaguardadas as suas finalidades religiosas e as exigências de sua proteção e da tutela dos arquivos de reconhecido valor cultural.COMENTÁRIO: O fenômeno religioso, como objeto de estudo, deve estar afeto aos intelectuais das áreas das ciências humanas, em especial sociologia, teologia e demais áreas correlatas. Sem dúvida não deve ser objeto de opiniões despojadas de fundamento científico, o que exporia as práticas de fé, as mais impróprias e perfunctórias avaliações, sobremodo quando suportadas por leigos.
Art. 6º A República Federativa do Brasil assegura, nos termos de seu ordenamento jurídico, as medidas necessárias para garantir a proteção dos lugares de culto das organizações religiosas e de suas liturgias, símbolos, imagens e objetos culturais, tanto no interior dos templos como nas celebrações externas, contra toda a forma de violação, desrespeito e uso ilegítimo.§1º Nenhum imóvel, dependência ou objeto vinculados às organizações religiosas, observada a função social da propriedade e a legislação, pode ser demolido, ocupado, penhorado, transportado, sujeito a obras ou destinado pelo Estado à entidades públicas de outro fim, saldo se por fundamentada motivação de utilidade pública, ou por interesse social, nos termos da legislação brasileira.COMENTÁRIO: A alteração que se insere no texto do §1º, busca assegurar a liberdade religiosa, através da proteção do patrimônio da organização religiosa. Esta é a real dimensão assegurada constitucionalmente ao exercício da atividade religiosa, pois que somente protegendo ao patrimônio da organizações religiosas, estaremos resguardando, definitivamente, os templos de qualquer culto.Em que pese a importância e fundamento de tal segurança jurídica, assegura-se ainda assim o super direito do bem comum, inerente a ação do estado no exercício de sua atividade essencial. Dessarte, observa-se esta circunstância e acata-se as decisões do poder do Estado, desde que observado o princípio da publicidade dos atos públicos, sejam as decisões da autoridade pública devidamente fundamentadas.§2º É livre a manifestação religiosa, através da expressão e divulgação pela palavra, imagem, meio eletrônico ou qualquer outro veículo de divulgação, em logradouros públicos, e privados com ou sem acompanhamento musical, desde que não contrariem a ordem e tranqüilidade pública.COMENTÁRIO: As alterações aqui sugeridas buscam salvaguardar as manifestações religiosas através de todos os meios de veiculação da informação hoje existentes, hoje não somente pela divulgação da palavra, mas também pela divulgação da imagem, pela conexão simultânea destas, e atualmente pela utilização dos meios eletrônicos e de satélites, no mundo global de nossos dias, com expressiva importância estrutura mundial da internet.
Art. 7º A República Federativa do Brasil se empenhará na destinação de espaços para fins religiosos, que deverão ser previstos nos instrumentos de planejamento urbano a ser estabelecido no respectivo Plano Diretor.
Art. 8º As organizações religiosas e suas instituições poderão, observadas as exigências da legislação competente, prestar assistência religiosa aos fiéis assistidos em estabelecimentos de saúde, de assistência social, de educação ou similar, ou detidos em estabelecimento prisional ou similar.COMENTÁRIO: As sugestões efetuadas buscam uma redação mais direcionada no sentido de garantir a assistência religiosa em situação específica de necessidade do fiel, assegurando, contudo, a manutenção das regras restritivas impostas pela Administração, sobremodo visando a segurança destes recintos especiais.
Art. 9º Cada organização religiosa, representada por capelães militares no âmbito das Forças Armadas e Forças Auxiliares, constituirá organização própria, assemelhada ao Ordinariato Militar do Brasil, com a finalidade de dirigir, coordenar e supervisionar a assistência religiosa aos seus fiéis, por meio de convênio com a União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Parágrafo Único. È assegurada igualdade de condições, honras e tratamento a todos os credos religiosos.COMENTÁRIO: As alterações sugeridas buscam facilitar a interpretação do texto. Os elementos essenciais a existência do Estado Brasileiro, que o representam nas suas diversas manifestações de poder público, se materializam através dos governos da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, entidades de direito público que traduzem a dinâmica do Estado. Dessarte, é de melhor técnica que se detalhe os órgãos de poder, pois através deles que se materializarão as ações do Estado, mediante Convênios. 
Art.10º As organizações religiosas poderão fundar instituições de ensino, em todos os níveis de escolaridade, a serviço da sociedade, em conformidade com os seus fins, e atendidas as determinações da legislação educacional.COMENTÁRIO: As alterações sugeridas no artigo 10º, buscam concentrar somente no caput do artigo toda a dimensão que se quer para o assunto educação, em essencial, garantir às organizações religiosas o direito de fundar instituições de ensino.
A atividade educacional é em sua totalidade regulamentada, de maneira que os demais parágrafos constantes do projeto originário são plenamente dispensáveis, pois é da competência do Ministério da Educação regular o ensino, que efetivamente o faz, nos seus diversos níveis de escolaridade, e nas suas diversas manifestações de intelectualidade e saber.
Art. 11º O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica da cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e legislação complementar, sem qualquer forma de proselitismo.COMENTÁRIO: Sugerimos a inclusão do termo legislação complementar, e não “outras leis vigentes”, sobremaneira pelo fato de que a legislação educacional, por sua própria característica se materializa pela manifestação dos órgãos reguladores, e não pelo legislativo. Dessarte, o termo legislação complementar é mais abrangente incorporando, não somente lei, mas as diversas manifestação da Administração no segmento da Educação.
Art. 12º O casamento celebrado em conformidade com princípios religiosos prolatados por organizações religiosas legalmente constituídas em conformidade com a legislação brasileira, desde que atendidas todas as determinações constantes da legislação civil pertinente, produzirá efeitos civis, a partir da data de sua celebração, cumpridos tempestivamente, os requisitos de legais de registro.Parágrafo Único. É direito do crente, em conformidade com as normas da organização religiosa, a comemoração pública ou privada das festividades religiosas, bem como a celebração de seu sepultamento conforme os ritos da própria religião professada.COMENTÁRIO: Sugerimos substancial alteração no texto deste artigo, tendo em vista que o mesmo está voltado no interesse dos fiéis da Igreja Católica, haja vista, sobretudo que condiciona a legalização do casamento que for celebrado em conformidade com o direito canônico.Certamente a redação sugerida é mais técnica, de aplicação a todas as práticas religiosas legalmente manifestas no Brasil, asseguradas as determinações essencial para a juridicidade do Ato, em conformação com a legislação brasileira regulamentar.
A inserção do parágrafo único é essencial na medida em que busca-se garantir o exercício da prática religiosa em suas manifestações festivas, bem como, garante-se o direito do exercício póstumo da religiosidade, em garantia de manifestação em vida pelo de cujus, da prática religiosa no seu sepultamento.
Art. 13º É garantido, como essencial à atividade religiosa, o segredo do ofício sacerdotal reconhecido em cada organização religiosa.COMENTÁRIO: A alteração sugerida assegura a manutenção do sigilo do ofício sacerdotal como elemento essencial à prática da ação ministerial e, portanto, essencial a atividade religiosa propriamente dita.
Ademais sugerimos a exclusão do termo “inclusive o ofício da confissão sacramental”, por traduzir prática específica da Igreja Católica, descaracterizando o elemento de generalidade da letra jurídica, sobremodo o texto de lei.
O que é essencial é o direito intocável ao sigilo sacerdotal, este abrange a privacidade da confissão sacramental, o que torna tecnicamente reprovável a sua evidenciação em separado no texto legal.
Art. 14º Às organizações religiosas e demais instituições religiosas, sem fins lucrativos, a elas vinculadas, que exerçam atividades social, educacional, editorial, científica, literária, artística e teológica, é assegurado imunidade de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços vinculados com as suas finalidades essenciais em conformidade com a Constituição brasileira.
COMENTÁRIO: As alterações sugeridas na redação do art. 14º busca concentrar no caput do artigo a aplicação da imunidade tributária a todos os segmentos essenciais e inerentes à manifestação fé de todo e qualquer segmento religioso.
Assim, ao se determinar o rol de beneficiários, não ficamos restritos aos templos, mas contemplamos o patrimônio da organização religiosa em suas variadas manifestações, pois, todas, se destinam ao aperfeiçoamento e à divulgação da religiosidade. Assim, contempla-se as editoras (que divulgam a palavra escrita e as linhas teológicas corroboradoras do seu entendimento e prática de fé); as atividades sociais (exteriorização da religiosidade através da prática de boas obras); as atividades educacionais (que contempla o desenvolvimento da intelectualidade delineado pela ótica da religiosidade); as manifestações artísticas (certamente um dos maiores patrimônios da humanidade se identifica na preciosidade das obras artísticas de cunho religioso, seja nas belas artes, seja na arquitetura e demais manifestações de genialidade e talento fundamentadas na convicção religiosa).
Resumidamente a redação proposta traz em seu conteúdo o objetivo de se garantir através de lei a efetiva dimensão da imunidade tributária constitucionalmente assegurada, cuja interpretação deve necessariamente ter essência teleológia, como a adequada metodologia hermenêutica que contempla a verdadeira abrangência e aplicabilidade do conteúdo da norma constitucional.
Art. 15º A relação laboral de natureza religiosa estabelecida entre os ministros ordenados ou fiéis consagrados e as organizações religiosas, não gera vínculo empregatício amparado pela legislação trabalhista, exceto se caracterizado desvirtuamento da finalidade religiosa.
Parágrafo Único. As atividades de natureza apostólica, pastoral, litúrgica, catequética, evangelística, missionária, prosélita, assistencial, de promoção humana e semelhantes poderão ser realizadas a título voluntário, observado disposto na legislação brasileira.
COMENTÁRIO: A proposta do art. 15º busca claramente definir que o trabalho sacerdotal decorre de uma convicção religiosa, não tem fundamento econômico, e portanto de natureza alheia ao direito do trabalho celetista.
O parágrafo único tem por objeto proporcionar que a relação de labor, quando executada com objetivo de atividade voluntária, possa ser dessa maneira expressamente manifesta através de contrato próprio de serviço voluntário.
Art. 16 Atendidas as disposições legais do Estatuto do Estrangeiro, os representantes jurídicos das organizações religiosas, no exercício de seu ministério e funções religiosas, poderão convidar sacerdotes e membros de institutos religiosos, que não tenham nacionalidade brasileira, para servir no território de sua jurisdição religiosa, e pedir às autoridades brasileiras, em nome deles, a concessão de visto para exercer atividade ministerial no Brasil.
Parágrafo Único. Poderão ser concedidos, conforme a apreciação individual de cada caso, vistos temporário ou permanente, fundamentados nas motivações do caput.
COMENTÁRIO: ALTERAÇÕES NO ART. 16º
As sugestões propostas para este artigo busca permitir o fluxo internacional dos clérigos, assegurando, todavia, as disposições legais específicas da legislação brasileira aplicada aos estrangeiros que pretendem entrar em território nacional. A movimentação dos religiosos devem necessariamente estar submetidas aos princípios da soberania nacional.
Art. 17 A União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, no âmbito de suas competências, e as organizações religiosas poderão celebrar convênios sobre as matérias de suas atribuições tendo em vista o atendimento do interesse público.
COMENTÁRIO: A sugestão aqui proposta buscam a manutenção de um texto mais técnico sob o aspecto da terminologia jurídica.
Art. 18 A violação à liberdade de crença e à proteção aos locais de culto e suas liturgias sujeita o infrator às sanções previstas no Código Penal, além da respectiva responsabilização civil pelos danos provocados.
Art. 19 Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

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