segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Em minas gerais essa bancada apoia o governador Aecio Neves, do PSDB

Em minas gerais essa bancada apoia o governador Aecio Neves, do PSDB.
27 DE DEZEMBRO DE 2008 - 18h56

Seppir se torna o novo alvo da bancada ruralista na Câmara Pressionado pela bancada ruralista do Congresso, o ministro da Secretaria Especial para Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Edson Santos, estuda retirar do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a competência de demarcar terras de comunidades remanescentes de quilombos.Sob forte lobby do setor agropecuário, a secretaria pode flexibilizar o Decreto 4887/03, celebrado pelos remanescentes quilombolas como um avanço histórico nas políticas públicas para afro-descendentes.As alterações têm sido debatidas em reuniões entre o ministro e o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Valdir Colatto (PMDB-SC). No dia 19 de novembro, o parlamentar retirou da pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara um projeto de decreto legislativo (PDL), de sua autoria, que suspendia o Decreto 4887. Temeroso de que o PDL pudesse ser aprovado na comissão justamente na Semana da Consciência Negra, o ministro da Seppir admitiu a possibilidade de modificar o artigo 2º do decreto e acolher outras sugestões de mudanças propostas pelos ruralistas.Limite para abrangênciaOutra modificação no texto negociada com Edson Santos seria a retirada do critério da "territorialidade" , pelo qual os remanescentes de quilombolas definem a abrangência de suas terras. De acordo com o parágrafo 3º, do artigo 2º do decreto, para a medição e demarcação das terras, a comunidade de remanescentes quilombolas deve indicar qual o espaço necessário para garantir sua reprodução física, social, econômica e cultural. Na prática, esse dispositivo permite que a terra seja estendida para além do espaço hoje ocupado pela comunidade."O decreto abriu um leque ilimitado para as pessoas que se dizem descendentes de quilombolas. Em vez de identificar as áreas que elas estão ocupando, ele identifica a área necessária para a manutenção de sua cultura. Isso abrange propriedades privadas, indústrias, vilas", critica Colatto. "A comunidade diz que precisa de 100 mil hectares para o grupo se manter e daí o Incra vai lá atrás de 100 mil hectares, sem contestar se aquela área é de propriedade privada ou não", acrescenta o deputado, sem apontar, porém, que órgão assumiria a responsabilidade pela titulação das terras. "Isso ainda será objeto de estudo."Quilombolas reclamam Segundo o coordenador- executivo da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Ronaldo dos Santos, as entidades quilombolas ainda não foram procuradas para debater eventuais mudanças no decreto. O coordenador afirma que o grupo não abrirá mão de demarcar seus territórios por meio de um critério mais abrangente e que o movimento não tem interesse em que o processo de titulação seja retirado do Incra."Lamentavelmente, a Seppir tem se dado ao direito de tomar decisões sem dialogar com o movimento, o que vem a ferir os direitos das comunidades remanescentes quilombolas. A gente torce muito para que essas mudanças não tenham a velocidade que costumam ter. Essas mudanças costumam vir como rolo compressor", lamentou Ronaldo.O Congresso em Foco procurou a Seppir para saber o posicionamento do ministro Edson Santos sobre as discussões com a bancada ruralista. Mas a secretaria não retornou o contato até o fechamento desta reportagem. Ruralistas protestam Desde 2003, quando o Incra passou a demarcar as terras de remanescentes quilombolas, o órgão emitiu 105 títulos em benefício dessas comunidades. Atualmente, cerca de 800 processos estão abertos à espera de titulação em praticamente todas as superintendências regionais do Incra. Os estados do Acre e de Roraima são os únicos do país que não possuem comunidades remanescentes de quilombo.Enquanto quilombolas reclamam da morosidade do Incra para titular as terras, parlamentares ligados ao setor agropecuário afirmam que é preciso retirar do órgão a competência dessa titulação. Eles argumentam que o Incra é uma instituição voltada para a reforma agrária e trabalha para os interesses de "organizações ideológicas", que pedem a "criação indiscriminada" de assentamentos rurais. Os argumentos são semelhantes aos do ministro de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger – responsável pelo Plano Amazônia Sustentável (PAS) –, que quer destituir o Incra do controle do ordenamento fundiário na Amazônia."
A questão da demarcação das terras dos quilombolas, com certeza, tem que ser retirada do Incra. O Incra não tem isenção para fazer esse trabalho, porque na condição dele, no sistema que atua, ele foi criado para fazer reforma agrária, ou seja, assentar pessoas. E é essa maneira de assentamento que eles estão adotando para os quilombolas" , contesta Colatto. Procurado pelo Congresso em Foco, o Incra preferiu não se manifestar a respeito do impasse. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, o instituto não fala sobre decisões ainda não tomadas. Mas a instituição garante que a situação dos remanescentes quilombolas não se confunde com o que prevê o artigo 184 da Constituição, que trata da desapropriação de terras por interesse social para fins de reforma agrária."No caso da desapropriação para regularizar áreas quilombolas, o entendimento é o de que a indenização [aos proprietários] será feita em dinheiro, e não por meio de Títulos da Dívida Agrária [como é feito para desapropriação para fins de reforma agrária]", justificou o Incra, por meio da assessoria. "Ficou claro que a desapropriação para manter vivas as comunidades deve ser tratada com o objetivo de preservar o patrimônio cultural brasileiro, também previsto na Constituição", complementou.Antes do decreto de 2003, todo o processo de titulação de terras quilombolas era feito pela Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura. A advogada da fundação Luciana Valéria explica, no entanto, que o antigo decreto (nº 3912/2001) permitia que a Palmares fizesse todos os projetos referentes ao processo de titulação de terras quilombolas, mas o órgão não tinha competência para desapropriar terras, o que impedia a criação efetiva de espaços quilombolas.Reconhecimento constitucional Atualmente, de acordo com a Fundação Palmares, existem no país mais de 3 mil comunidades remanescentes de quilombos, áreas de refúgio dos escravos negros. Dessas, apenas 1.252 são reconhecidas e possuem a certidão de auto-reconhecimento emitida pela Fundação – documento necessário para dar entrada, junto ao Incra, no processo de titulação da terra.A concessão de título para terras ocupadas por remanescentes quilombolas é garantida pela Constituição desde 1988, no artigo 68 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A partir de 2003, essa delimitação passou a ter uma abrangência maior com a inclusão do critério de territorialidade. Considerado pelo setor agropecuário muito subjetivo, esse conceito de território determina que a área a ser titulada seja mais do que o espaço ocupado com a moradia."Apesar de morar em um espaço, utilizamos outros espaços para extrativismo, pesca, terreno sagrado, cemitério antigo e outros fins. Há comunidades, por exemplo, que são nômades. Esses espaços são necessários para nossa continuidade como grupo e isso não tem lógica para o branco. Temos o território como uma coisa sagrada. A terra é nossa mãe e não podemos vender ou dar a mãe", defendeu o coordenador-executivo da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, Ronaldo dos Santos.Interesses econômicos. Para o deputado Domingos Dutra (PT-MA), o único parlamentar remanescente quilombola, a pressão da bancada ruralista para mudanças na titulação de terras é decorrente de interesses econômicos de latifundiários que temem perder parte de suas terras. Dutra afirma que as comunidades não irão aceitar que se restrinja o conceito de territorialidade."Os ruralistas reclamam de barriga cheia. Pelo sofrimento que os negros passaram, pela dívida que a nação brasileira tem com seus descendentes, a titulação de terra ainda está muito lenta", afirma Dutra. "Nós defendemos a terra quilombolas para o ser humano. Eles defendem a propriedade para o gado. São valores diferentes".
Fonte: Congresso em Foco

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