"O racismo no Brasil pelo olhar de quem veio de fora", por Leonardo Sakamoto
“Open
Arms, Closed Doors” é um filme sobre um imigrante angolano que vive na
favela da Maré, no Rio de Janeiro, e compõe rap para combater o
preconceito sofrido diariamente. Pedi para as diretoras, as brasileiras
Fernanda Polacow e Juliana Borges, um texto sobre a experiência de
produzir o documentário, que estreia, nesta segunda (18), pela rede de
TV Al Jazeera.
Vale a pena assistir e compartilhá-lo nas
redes sociais. O resultado acaba funcionando como um espelho do que
somos, mostrando que, não raro, agimos com o mesmo preconceito utilizado
contra nós por alguns cidadãos e governos do centro do mundo.
O racismo no Brasil pelo olhar de quem veio de fora, por Fernanda Polacow e Juliana Borges*
Discutir o racismo na sociedade brasileira sempre é um assunto controverso. Para início de conversa, uma parcela significativa da nossa população insiste em dizer que este é um problema que não enfrentamos. Somos miscigenados, multirraciais, coloridos. Como um país assim pode ser racista?
Discutir o racismo na sociedade brasileira sempre é um assunto controverso. Para início de conversa, uma parcela significativa da nossa população insiste em dizer que este é um problema que não enfrentamos. Somos miscigenados, multirraciais, coloridos. Como um país assim pode ser racista?
Foi essa a
pergunta que o angolano Badharó, protagonista do documentário “Open
Arms, Closed Doors” (Braços Abertos, Portas Fechadas), que dirigimos
para a rede de TV Al Jazeera e que será veiculado a partir de hoje em
130 países, se fez quando chegou ao Brasil em 1997 esperando encontrar o
Rio de Janeiro que ele via nas novelas.
Badharó é um dos milhares de angolanos que
vieram viver no Brasil. Depois de fugir da guerra civil no seu país de
origem, escolheu aqui como novo lar – um país sem conflitos, alegre,
aberto aos imigrantes e cuja barreira da língua já estava ultrapassada à
partida. Foi parar no Complexo da Maré, onde está localizada a maior
concentração de angolanos do Rio de Janeiro.
Para quem
defende que o Brasil não é um país racista, vale ouvir o que ele, um
imigrante negro, tem a dizer sobre a nossa sociedade. Badharó não nasceu
aqui, não carrega nossos estigmas, não foi acostumado a viver num lugar
em que muitos brancos escondem a bolsa na rua quando passam ao lado de
um negro. Depois de 15 anos vivendo numa comunidade carioca, ele tem
conhecimento de causa suficiente para afirmar: “O Brasil é um dos países
mais racistas do mundo, mas o racismo é velado”. O documentário segue a
rotina deste rapper de 35 anos e mostra o dia a dia de quem sofre na
pele uma cascata de preconceitos, por ser pobre, negro e imigrante.
Além de
levantar o tema do nosso racismo disfarçado, o documentário propõe,
também, uma outra discussão: agora que estamos nos tornando um país alvo
de imigrantes, será que estamos recebendo bem esses novos moradores?
Com a
ascensão do Brasil como potência econômica e o declínio da Europa,
principal destino de imigração dos africanos, nos tornamos um foco para
quem não apenas procura uma situação melhor de vida, mas para quem
procura uma melhor educação ou mesmo um bom posto de trabalho. São
muitos os estudantes africanos de língua portuguesa que desembarcam no
Brasil. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, Angola foi o
quarto país do mundo que mais solicitou visto de estudantes no Brasil em
2012. Com esta nova safra de imigrantes, basta saber como vamos nos
comportar.
Europeus e
norte-americanos encontram nossas portas escancaradas e nossos melhores
sorrisos quando aportam por aqui, mesmo que estejam vindo de países
falidos e em situação irregular. No entanto, um estudante angolano com
visto e com dinheiro no bolso, continua sofrendo preconceito. Foi este o
caso da estudante Zulmira Cardoso, baleada e morta no Bairro do Brás,
em São Paulo, no ano passado. Vítima de um ato racista, a estudante
virou o mote de uma musica que Badharó compôs para que o crime não fique
impune. Isto porque tanto as autoridades brasileiras quanto as
angolanas não deram sequência nas apurações e o crime segue impune.
A
tentativa de abafar qualquer problema de relacionamento entre as duas
nações pode afetar as interessantes parceiras comercias que existem
entre os dois governos. Para todos os efeitos, continuamos sendo ótimos
anfitriões e estamos de braços abertos para quem quer aqui entrar.
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